Curadoria de Ana Rocha
Com os Diálogos em Marvão, mais uma pequena ‘capela’ se abre este ano no ‘mosteiro’ musical do FIMM (Festival Internacional de Música em Marvão) que continua a sua expansão, desta feita com uma iniciativa que trará para o palco alguns dos debates da filosofia, da história, do cinema e da crítica. Diálogos em Marvão nasce ligado à esfera das ideias com uma primeira edição a concretizar-se no dia 5 de Maio, ao longo de uma jornada em que seis intelectuais são convidados a partilhar com o público a sua paixão por conceitos, teorias, perspetivas e polémicas.
Há mais de 100 anos, Debussy compôs para a terceira parte de ‘La Mer’ os ‘Diálogos entre o vento e o mar’, uma sucessão musical de tempestades e acalmias. Os diálogos aqui serão de outro tipo e com outros ritmos, no cenário idílico do parque natural da serra de São Mamede, entre a vila de Marvão, as ruínas arqueológicas da cidade de Ammaia e a Quinta dos Olhos d’ Água, ocasião em que novos domínios que não são os da música saltarão para a ‘arena’ da vila alentejana. Trata-se de uma ocasião para o encontro entre intelectuais do panorama cultural português, brasileiro e italiano – três filósofos, uma historiadora, um musicólogo e um crítico – convocados agora para um painel de diálogos, troca de ideias e jogo com perceções diferentes. O projeto tem o propósito de criar um espaço para aprofundar observações, experiências e investigações, aproximando
o público da reflexão filosófica e artística. Com entrada livre, a assistência poderá acompanhar os seis intelectuais convidados para a primeira edição de Diálogos em Marvão, num mosaico de comentários / dúvidas / problemáticas / caminhos /divergências /tensões /trocas de ideias / conexões / concordâncias / argumentos.
Com a criação do Festival Internacional de Música de Marvão (FIMM), a vila de Marvão surgiu em 2014 como uma espécie de encruzilhada espacial e temporal, inscrevendo-se na região do Alto Alentejo com uma configuração que começou por ser a de um festival com os seus tempos musicais e que, ao longo de várias edições, foi inventando novos formatos e novas linguagens, dilatando os efeitos da nova paisagem musical ao longo de vários meses, através também da criação da Academia de Marvão (Marvão Academy) transformada num dinâmico polo de atividades culturais.
A natureza com a sua vegetação e o seu panorama envolvente de serranias, vales e rochedos surgiu como uma nova Montanha Mágica situada no Alto Alentejo, naquela que foi a vila morta e despovoada de Marvão e que se transformou numa vila viva e florescente durante as sucessivas edições do FIMM, o evento cultural descentralizador criado em 2014 por iniciativa do maestro e violinista Christoph Poppen.
Com a sua vida vegetal, animal e mineral, a própria paisagem alentejana começou a ser integrada em relações diversas estabelecidas entre a população de Marvão, de Castelo de Vide e de Portalegre e os músicos, artistas, gestores de eventos, melómanos, jornalistas, mediadores culturais, veraneantes e profissionais de turismo que passaram a frequentar a região.
No sopé da serra e junto às ruínas romanas, a Quinta dos Olhos d’Água acolhe agora um seminário de ideias, o local ideal para o público assistir e participar na magia das palavras dos conferencistas. Sempre foram as palavras e as narrativas que conseguiram operar as mudanças que as sociedades exigiram.
A linguagem transforma o mundo e, sobretudo, a maneira de pensar e de ver o mundo. Em teoria, poder-se-ia explicar uma cultura dissecando as suas palavras.
Caminhar e passear pela Quinta dos Olhos d’ Água com a sua borbulhante nascente e o seu lago, observar a natureza com as suas cores e odores, avançar passo a passo na floresta entre o ruído das águas, da folhagem, dos insetos e das aves, são experiências físicas a recordar de imediato a nossa pertença a um meio vivo, nas nossas sociedades cada vez mais intolerantemente instrumentalizadoras do indivíduo. Marchar e cirandar no meio rural da Quinta dos Olhos d’Água supõe uma liberdade e um esquecimento de si que também predispõe à reflexão.
Durante a jornada dos Diálogos em Marvão, estará ao dispor do público um espaço bucólico (sim, ainda existem esses locais amenos!) que supõe uma pausa para escutar, pensar e meditar e também o lugar para deambular e atravessar a paisagem arcádica dos “alegres campos, verdes arvoredos, claras e frescas águas de cristal, silvestres montes, ásperos penedos”. O mundo estará tanto nas nossas mentes e sob o nosso olhar crítico como sob os nossos pés.
António Marques: Que tipo de paz procura a filosofia?
António Guerreiro: A tonalidade da época, colapsologia e imaginário dos fins.
Rui Baldaque Romão: De Mandeville a Hogarth, variedade e linha serpentina.
Renato Lessa: Filosofia política, abstração e formas de vida.
Dalila Rodrigues: Passado reinventado.
Paolo Pinamonti: Música e cinema.
5 de Maio
10H00 – Renato Lessa – Filosofia política, abstração e formas de vida.
10H45 – Rui Baldaque Romão – De Mandeville a Hogarth, variedade e linha serpentina.
Coffee break
11H45 – Dalila Rodrigues – Passado reinventado.
Pausa para almoço.
15H00 – António Marques – Que tipo de paz procura a filosofia?
15H45 – António Guerreiro – A tonalidade da época: colapsologia e imaginário dos fins.
Coffee break
17H00 – Paolo Pinamonti – Música e cinema.
18H00 – Debate entre os participantes e diálogo com o público.
19H00 – Encerramento.
Duração de cada comunicação: 30 minutos.
O filósofo António Marques é professor catedrático na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. As suas mais recentes publicações intitulam-se ‘Radical Evil and the Power of Judgment’ e ‘Wittgenstein on Understanding and Description’.
O jornalista e crítico António Guerreiro é cronista Público e editor da revista trimestral Electra (Fundação EDP). É docente convidado na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. A sua publicação mais recente intitula-se ‘O Demónio das Imagens. Sobre Aby Warburg’.
O filósofo Rui Bertrand Baldaque Romão é professor associado na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Na sua investigação, apresentam-se como temas de eleição o ceticismo, a filosofia moderna e a contemporânea, a filosofia política e a estética. As suas publicações incluem ‘A Apologia na Balança’ e ‘Quid? Estudos sobre Francisco Sanches’.
O filósofo Renato Lessa é professor titular aposentado da Universidade Federal Fluminense, catedrático da Pontifícia do Rio de Janeiro, diretor do Centro Primo Levi na mesma universidade e investigador associado do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e da Lettres Sorbonne Université. Presidiu à Biblioteca Nacional de 2013 a 2016. A sua publicação mais recente intitula-se ‘O Cético e o Rabino’.
A historiadora de arte Dalila Rodrigues é diretora do Mosteiro dos Jerónimos e da Torre de Belém. É doutorada em História da Arte pela Universidade de Coimbra e professora do ensino superior. A história da pintura portuguesa dos séculos XV e XVI, o património artístico e os museus são temas de eleição no seu percurso profissional, na investigação e na autoria de publicações.
O musicólogo Paolo Pinamonti é professor em Veneza na Universidade Ca Foscari onde leciona as cadeiras de História da Música Contemporânea e História da Música para o Cinema. Foi diretor do Teatro San Carlo de Nápoles, do Teatro da Zarzuela de Madrid, do Festival Mozart de La Coruña e do Teatro Nacional São Carlos de Lisboa. Atualmente é o diretor artístico do Macerata Opera Festival.